Pega Essa Hq – Popeye de Lelis e Ozanam
Popeye, Lelis, Drummond e o herói que teima em ser humano
Skript Editora traz HQ com um novo olhar sobre o marinheiro comedor de espinafre. E emociona.
“Velho. É o que sou. Quero tudo e nada quero. Posso? Permites-me tal ousadia? Subir a mais alta montanha, conhecer o algures e o nenhures; tocar o fundo de todos os mares e deitar-me com as estrelas e correr como o vento.“
— Ernest Hemingway, O Velho e o Mar
E ao cair da tarde, o mar se acalmou. A pesca havia sido escassa e o velho marinheiro voltava pra casa carregando uma rede de decepções. Amanhã a vida começaria novamente e a inglória batalha entre o lobo do mar e o oceano recomeçaria.
E é assim que essa história começa. Visceral. Como reencontrar um velho amigo depois de anos. Ele mudou, você mudou. Algumas feridas a mais provocadas pela trajetória inconstante da vida. Alegrias e tristezas por trás daqueles olhos. Ou melhor, de um olho só.
O velho marinheiro que sempre nos fez companhia nas manhãs em frente à TV viajou os sete mares, encarou tornados e veio nos contar um pouquinho de suas histórias.
Logo na primeira página Ozanam já mostra que não está de brincadeira.
Alguns têm a obsessão de Ahab. Nós temos a honestidade de Popeye
Macacos me mordam!
Assim que a notícia foi dada, o mundo dos quadrinhos brasileiros foi tomado de assalto.
O próprio catarse não segurou. Meta batida e dobrada, duplicada, triplicada. o que era 100% virou 200, 300, um sem número de porcentos. Um dos nossos maiores artistas ilustraria um dos mais queridos personagens da cultura pop.
E nesse finzinho de 2021 chega até nós a HQ do ano.
Sem dúvidas
Popeye de Ozanam e Lelis, desembarca aqui via crowdfunding pela Skript Editora, trazendo consigo uma narrativa peculiar e intimista sobre o maior divulgador de espinafre da história.
A qualidade do quadrinho é impecável: 116 páginas, papel couché, marcador de página além de uma introdução contando a trajetória tanto do personagem quanto de seu criador.
E a historia desse Popeye é crua, agridoce. Carrega uma melancolia poética traduzida na arte magistral de Lelis e no texto impiedoso de Ozanam. Mas ainda assim há familiaridade com os personagens. Eles apenas estão mais humanos.
E o que seria de um protagonista sem um elenco de coadjuvantes à altura? O eterno rival Brutus está por lá, assim como Dudu e seus hambúrgueres, além, é claro da diva Olívia Palito que está surpreendente nessa edição.
O herói que teima em ser herói. O personagem de tirinha que fala errado e não foge da briga. Popeye já nasceu como uma contradição. Não carrega em si a beleza kryptoniana que chegaria quase dez anos depois, nem tampouco é dado a conselhos. Popeye é de uma sinceridade brutal.
Nascido como coadjuvante da tirinha “Thimble Theater” em 1929 da mente de um artista que teimava em ser artista e perseguiu a por muitas vezes inglória carreira de ilustrador, Elzie Crisler Segar. O resto, bem, é história em quadrinhos.
Que logo se tornaria desenho animado e chegaria ao Brasil.
E foi aí que por aqui a magia aconteceu.
Quando Popeye encontrou a sua voz na lenda Orlando Drummond que deu a personalidade perfeita pro marujo e imortalizou-o na nossa memória. Impossível ler esse quadrinho e não vir a voz de Drummond na mente. Ele fez do Popeye mais nosso que do mundo. Agora que o mestre nos deixou, muita sorte aos próximos dubladores. Eles vão precisar.
Fim de ano, época de reencontrar velhos amigos. Reencontre esse velho marujo ora cansado, ora mau-humorado mas sempre consciente de quem é.
Ernest Heminghway
“Eu sou o que sou”.
E quem não é?