Pega Essa HQ- Como uma Luva de Veludo Moldada em Ferro

9 de dezembro de 2020 Rita Zuini

Conheça o quadrinho mais bizarro que você lerá na sua vida

Como uma luva de veludo moldada em ferro é surrealismo da melhor qualidade

O que aconteceria se David Lynch escrevesse uma HQ?

Se você já se fez essa pergunta (quem nunca, né?), Como uma luva de veludo moldada em ferro de Daniel Clowes, HQ lançada pela editora Nemo, pode chegar o mais próximo de responder a essa dúvida.

Pra quem não sabe de quem se trata, Daniel Clowes já é bem conhecido da galera fã dos comics que vão além de caras musculosos que usam a cueca por cima da calça.
Além de quadrinista, também é ilustrador e já teve seu trabalho publicado no The New Yorker, Newsweek, Vogue entre outras gigantes do mercado editorial americano. Também teve HQs levadas ao cinema numa época em que isso não era tão carne de vaca quanto hoje. É o caso de Art School Confidential e Ghost World, estrelando ninguém menos que Scarlett Johansson (sim, a Viúva Negra tá nessa vida de adaptações de HQs há mais tempo do que se imagina) cujo roteiro teve uma indicação ao Oscar. E pra quem é do punk rock, Clowes animou o clipe de “ I don’t Wanna grow up” dos Ramones. Sim, o cara é pica.

Pega aí o clipe dos Ramones e depois volta, senta aqui pra gente conversa…

Pois bem, após as devidas apresentações, chegamos ao seu trabalho mais perturbador:

Como uma luva de veludo moldada em ferro.

“Pega sua latinha e vai fazer seu inferninho longe daqui, Daniel Clowes”

Clay Loudermilk, um típico loser americano acredita ter visto uma ex-namorada em um snuff film (aqueles filmes pornôs onde supostamente rolam assassinatos reais). Surpreendido com a situação, nosso herói parte em uma aventura disposto a descobrir como a moça foi parar nesse tipo de produção.

Bem, a premissa é essa. E o negócio só tende a ficar mais incrível com o desenrolar da trama onde nos são apresentados um elenco tão peculiar quanto bizarro, com pessoas com camarões no lugar de olhos, uma seita a lá Charles Manson, garotas deformadas com feições de batata, cachorros sem cabeça alimentados por injeções e um sem número de personagens envolvidos em situações nonsense tendo como pano de fundo uma teoria de conspiração sobre um mascote de armazém. Dizer mais do que isso é estragar a surpresa guardada nas 142 páginas de arte em preto e branco toda trabalhada no nanquim de Clowes, que foge do que estamos acostumados a ver nas revistas de super-heróis ou em qualquer quadrinho convencional.

É complicado falar de uma obra tão hermética e dada a tantas interpretações como essa, onde várias situações aparentemente sem sentido se relacionam traçando um emaranhado tão absurdo e surreal quanto as obras cinematográficas de Lynch.

Aqui não vale apena uma leitura. A cada nova visita ao estranho mundo de Daniel Clowes, você descobre uma mensagem codificada, uma crítica ao american way of life, às instituições, a sociedade. Enfim, uma obra pra ser lida e analisada aos poucos. Quem seria a namorada de Clay? Qual é a da tal seita? Quem é Mr. Jones? Quem é o pai de Tina? No final da experiência talvez você tenha mais perguntas que respostas. E é aí que mora toda a genialidade da obra.
É muita insanidade junta.

Como uma luva…. foi produzido entre 1989 e 1993 e só chegou por aqui em 2018. Muito tempo pra esperar por essa obra-prima do surrealismo. Antes tarde do que nunca.